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Lula já foi vítima. Agora Bolsonaro. E amanhã? O julgamento da tentativa de golpe de Estado abre um perigoso precedente

Conquista News
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Por Leonardo Mascarenhas
Advogado criminalista e colunista do ConquistaNews

Durante o julgamento do Mensalão, fui um crítico ferrenho da condução processual. Não discuti se Lula ou qualquer outro réu deveria ou não ser condenado. Mas alertei, à época, para o grave risco de que se criasse um direito penal de exceção — um direito moldado por conveniência política e pelo clamor popular, e não pelas regras e garantias que um Estado de Direito deve respeitar.

Direito penal de exceção é aquele aplicado fora das regras ordinárias do processo e do julgamento, utilizado para casos de forte pressão política ou midiática. O problema é que, uma vez criado para casos “excepcionais”, ele rapidamente se espalha e contamina o sistema inteiro, atingindo qualquer cidadão comum.

O resultado do Mensalão está aí para quem quiser ver: criou-se, por exemplo, um precedente que hoje permite negar a liberdade de recorrer mesmo em situações que, até então, jamais ensejariam prisão imediata. E isso não ficou restrito aos políticos — atingiu milhares de cidadãos anônimos, que hoje enfrentam execuções penais antecipadas em razão daquele precedente.

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Infelizmente, vejo o mesmo filme se repetir agora no julgamento da chamada tentativa de golpe de Estado, com o ex-presidente Jair Bolsonaro.

E volto a alertar: não estou aqui para defender réus ou partidos. Defendo o Direito — e o respeito inegociável às suas regras.

É um dos maiores absurdos jurídicos da nossa história recente ver um julgador atuar como vítima e, ao mesmo tempo, como condutor do processo. A suspeição aqui não é discutível — é gritante.

Além disso, na audiência de ontem, o Ministro Alexandre de Moraes desrespeitou frontalmente o artigo 212 do Código de Processo Penal — norma em vigor há 17 anos — ao tomar para si a condução da prova oral.

A função do juiz não é produzir provas, mas garantir que a produção se dê pelas partes, sob um sistema acusatório. Quando o magistrado assume o papel de inquisidor, temos um retrocesso institucional.

E mais: essa não é, como disse a Ministra Cármen Lúcia, uma mera nulidade relativa. É uma nulidade de ordem cogente. E o ônus de demonstrar que não houve prejuízo à defesa não pode jamais recair sobre o réu — deve ser suportado pelo Estado.

Mas o que mais me preocupa não é apenas este processo em si. É o exemplo que está sendo transmitido às cortes inferiores.

Juízes de 1º grau, já pressionados pelo discurso punitivista, absorvem rapidamente essas práticas quando elas vêm “de cima”. E quando isso acontece, é o cidadão comum quem sofre.

O direito penal é o ramo do direito mais próximo da vida de qualquer pessoa. Quem nunca disse, em um momento de emoção: “Se matarem meu filho, minha esposa, meu pai, eu mato o indivíduo”?

Pois bem: nessas situações extremas da vida, que regra você gostaria que se aplicasse a você? A regra que garanta um julgamento justo, com pleno respeito às normas processuais, ou o “direito penal de ocasião” que hoje se molda para condenar políticos impopulares?

Tanto Lula, no passado, quanto Bolsonaro, no presente, estão sendo vítimas de um direito processual penal manipulado por conveniências políticas.

Mas os verdadeiros prejudicados seremos nós — cidadãos comuns — que começaremos, em breve, a sofrer as consequências dessa erosão das garantias.

Hoje você pode achar tudo isso muito “legal”, como muitos acharam no Mensalão. Mas amanhã?

Estou, sim, com medo do que está por vir.

Medo das consequências desse novo formato de aplicação do Direito, que já escorre pelas instâncias e chegará até os cidadãos comuns.

Começaremos a sofrer as consequências em breve. Não se esqueçam: o direito penal é o mais próximo de qualquer cidadão de bem.

Tanto Lula quanto Bolsonaro são vítimas de um direito processual penal criado por conveniência política. Mas isso deixa precedentes perigosos — e permanentes — para você, cidadão comum.

Agora você pode estar achando tudo isso interessante, como outros acharam lá atrás. E depois?

Atenção: já vi esse filme com as consequências jurídicas deixadas no julgamento do Mensalão. E agora estou vendo novas consequências que ficarão do julgamento de Bolsonaro.

Quem sempre perde é o cidadão comum. Quem sempre paga a conta é a sociedade.

Precisamos debater isso com seriedade enquanto ainda temos tempo.

Leonardo Mascarenhas
Advogado Criminalista

Vivendo e Respirando o Direito há mais de 21 anos

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